terça-feira, 14 de abril de 2009

S O B R E A I D A D E M É D I A


S O B R E A I D A D E M É D I A


ROQUE DE BRITO ALVES
Professor e Advogado
jodigitacao@hotmail.com



1 – Em alguns livros e artigos na imprensa nacional e estrangeira, vez por outra, surge sempre a qualificação da Idade Média como sinônima de “obscurantismo”, de “longa noite de trevas de mil anos”, de “atraso”, etc. sem valor algum, em termos de cultura, o que demonstra claramente um desconhecimento da História.

2 – Negando tal compreensão ou adjetivação, argumentamos sob perguntas em síntese: Pode ser assim classificado um período em que existiram na literatura o gênio de Dante (1265-1321) com “A Divina Comédia” – uma das obras primas da literatura universal – , o grande poeta Torquato Tasso, um Chaucer (o pai da literatura inglesa)? E na pintura um Giotto, um Cimabue? Na arquitetura, as maravilhosas catedrais de estilo gótico – Notre Dame de Paris, a de Milão, a de Estrasburgo, a de Colonia, etc. – , com os seus incomparáveis vitrais – basta lembrar os da “Sainte Chapelle”, em Paris – ou com as suas belíssimas fachadas de mármore colorido (de Siena, de Florença, de Pisa, com a sua torre inclinada, etc.), além das inúmeras basílicas e igrejas de estilo românico na Itália, na Espanha, etc.? E a beleza das cidades medievais ainda preservadas – Carcassone, Ávila, Rotenburgo, Lucca, etc. – , com as suas muralhas? E o trabalho paciente dos denominados “monges copistas” que possibilitou o conhecimento da filosofia de Aristóteles, Platão e de Sócrates para toda a Europa? E a fundação das famosas universidades de Bolonha (a primeira do mundo em 1088), Pádua, Sorbonne, Salamanca, Coimbra, Oxford, Heidelberg, etc., ainda hoje muito importantes no mundo da cultura? E os castelos europeus e os “Palazzi” em Veneza? E a obra de arte refinada das “iluminuras” nos manuscritos, da tapeçaria, da imaginária sacra, dos mosaicos (basta citar-se os de Ravena, na Itália), dos “afrescos”, do marfim, das jóias, etc. que ainda hoje impressionam? E a filosofia e a teologia de São Tomás de Aquino colocado ao lado de Aristóteles e de Kant como um dos maiores filósofos do mundo? E na área do Direito, a “Magna Charta Libertatum” da Inglaterra, de 1215, com as suas garantias fundamentais do cidadão e também a grande construção doutrinária dos praxistas (ou “práticos”) e glosadores (sobretudo no campo do Direito Penal) dos sécs. 12 e 13 – Gandinus, Bartolus, etc. – que se estendeu até o início da Idade Moderna – Farinacius, Decianus, Clarus, Covarrubias, etc. – e que muito contribuiu para o florescimento da profunda dogmática jurídica dos sécs. 19 e 20 (mesmo sendo o Iluminismo do Séc. 18 o seu fator principal)? Etc. etc.

3 – É inegável que a Idade Média teve os seus erros terríveis, os seus males, vícios, virtudes e defeitos, como também agora o mundo contemporâneo apresenta com as suas guerras, genocídios, drogas, violência, atentados contra a natureza, violações da dignidade da pessoa humana, o dinheiro como o seu deus maior.
Mesmo assim, pelos exemplos citados em síntese, quem somente critica negativamente em termos culturais sem lhe reconhecer valor algum a Idade Média, revela verdadeiramente uma grande ignorância da História, e nesta modesta análise sobre a mesma espera-se que também o autor destas linhas não seja pejorativamente considerado como de “mentalidade medieval”.

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Apenas um corajoso advogado de defesa poderia incumbir-se da apologia de todo um período histórico. Ainda por cima o mais atacado deles! O medievo.
    Há riqueza e crescimento da civilização como um todo no período, isto é fato e bem alegado pelo ilustre autor. Porém, como diz Aristóteles (cuja obra foi proibida na Universidade de Paris por todo século XIII com apenas 100 anos de tradução)"Conhecer é conhecer por analogia". E que época comparada com o medievo sobre esta não se detaca?
    A antiguidade lhe supera na democracia, na escultura de Míron e Praxíteles, na glória cosmopolita de Roma, nos pensadores eternos que o próprio Dante chama "mestre daqueles que sabem" ao visitar o limbo acompanhado de Virgílio, seu modelo oriundo deste tempo mais brilhante..
    A modernidade chega a envergonhar o pobre medievo com os fulgurantes gênios do renascimento, Miguel Angelo sozinho deu ao mundo mais beleza que os mil anos que lhe precederam.
    Aqui chegamos ao ponto: a única época a que podemos comparar o medievo sem ladear-lhe com gigantes é nossa raquítica idade contemporânea. Onde estão nosso Platão e nosso Kant? Nosso Beccaria, nosso Péricles? Nosso Míron e nosso Da Vinci?
    O que me dá esperança é que se o mestre Roque de Brito pode defender o medievo, pode defender a conteporaneidade, afinal, do jeito que as coisas vão, ela logo precisará de um bom advogado.

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