segunda-feira, 23 de março de 2009

Reunião do Dia 21 de março



Caros pesquisadores,

Sábado, dia 21 de março, tivemos a primeira reunião de nosso grupo de pesquisa no ano de 2009. Nesta reunião foram apresentadas as novidades, como o nosso blog, bem como os planos para 2009. Lembramos que deve ser levado para a próxima reunião o objeto (tema) de pesquisa. Caso tenha dúvida, procure um dos professores que compõem o grupo.
Outra novidade é a necessidade de trazer, também para a próxima reunião, a ficha de inscrição preenchida, já que o grupo está na iminência de ser regularizado perante a instituição, levando a possibilidade do ganho de horas de atividade complementar. A ficha de inscrição estará disponível em breve em nosso blog.
Para a próxima reunião já temos alguns alunos com apresentações agendadas.

quarta-feira, 18 de março de 2009


A I N D A S O B R E O C I Ú M E C O M O P A I X Ã O P E R I G O S A


ROQUE DE BRITO ALVES
Advogado e Professor da Faculdade Maurício de Nassau
jodigitação@hotmail.com

1 – Sustentamos que no crime por ciúme demonstra-se claramente que o ciúme não é prova de amor como muitos pensam e sim, ao contrário, de um amor-próprio, de egoísmo, de um “amor deturpado ou deformado” que nega a própria essência do amor. Delito por ciúme que é uma manifestação ou combinação de egoísmo, amor-próprio e instinto sexual (mais no homem, como já destacamos). Assim, não se deve confundir “ciúme” com “amor”, não são dois sentimentos ou paixões inseparáveis científica e psicologicamente, é distorção a tal respeito.
Por outra parte, expressa uma idéia deformada de justiça pois o delinqüente ciumento “julga” que a vítima “merece” o que ele fez, tudo geralmente aliado a um estado psicológico de profunda perturbação de ânimo que impossibilita o auto controle emocional, sobretudo pela paranóia de ciúme mórbido, obsessivo, delirante.
2 – São apresentadas como soluções opostas sobre o problema do crime passional “quem ama, não mata” e “quem ama, não trai”.
3 – Particularmente – e as estatísticas demonstram – o homicídio por ciúme é mais praticado contra a esposa, ex-esposa, companheira, amante, namorada que contra um rival ou suposto rival, imaginário, por entender a mente delirante do ciumento que a sua ação é “uma ação de justiça”, uma sua autoafirmação pela “injustiça sofrida” com “a traição” (mais imaginária que real) e assim o ciumento nunca se sente “culpado” por seu crime, embora muitas vezes - como uma das características do delito passional – venha a cometer suicídio. Na literatura, desde a famosa tragédia” “Othello” de Shakespeare até o romance moderno “Ciúme” da René Gusman tal aspecto da psicologia do ciumento está bem descrito.
4 – Nesta síntese sobre problema tão complexo, profundo e amplo, o ciúme do homem e o da mulher (embora com as suas naturais distinções culturais e do próprio sexo) apresentam a mesma potencialidade criminosa, uma grande tendência a reação delituosa final homicida ou de lesões corporais, variando somente em função de algumas circunstâncias – meio e modo de execução do delito, etc. – , de aspectos secundários. Entretanto, é inegável como fenômeno mais comum e evidenciado pelas estatísticas que o homem ciumento comete mais delito que a mulher ciumenta, inserindo-se, aliás, na estatística geral em todos os países de maior criminalidade masculina que a feminina.
5 – Sob outro aspecto, apesar de facilmente tornar-se uma paranóia (que é uma espécie de psicose), o ciúme como sentimento ou paixão não é por sua própria natureza algo anormal, patológico, sendo, ao contrário, um fenômeno psíquico ou paixão comum, natural, uma paixão como as outras existentes nos seres humanos (amor, inveja, ódio, vingança, etc.). Assim, o criminoso ciumento não é um anormal, um doente mental, um psicótico, tem inteligência e vontade normais, é penalmente responsável, merecendo, em tese, a aplicação de pena e não a sua isenção. Mesmo assim, reafirmamos: é paixão perigosa, criminógena por sua própria natureza e pode, em certas personalidades, atingir uma forma alucinatória, delirante, a “mania ou delírio de ciúme”, falando alguns psiquiatras em “psicose passional”, em “loucura do ciúme”, em “loucura da dúvida” na psicologia exacerbada do ciumento. Portanto, é muito difícil a distinção entre o “ciúme normal” e o “anormal” como em nenhuma outra paixão humana, porém o povo diz que alguém está “louco de ciúmes”.
6 – Sem dúvida, “o medo da perda” da pessoa amada caracteriza profunda e decisivamente a psicologia do ciumento, em nosso entendimento é o “não posso viver contigo e nem sem ti” e como solução homicida extrema para a sua mente atormentada se ela não pode ser “sua”, não “será” de nenhum outro.

C I Ú M E: PA I X Ã O P E R I G O S A


C I Ú M E: PA I X Ã O P E R I G O S A

ROQUE DE BRITO ALVES
Advogado e Professor da Faculdade Maurício de Nassau
jodigitação@hotmail.com

1 – A tragédia ocorrida (e outras recentemente em nosso país) em Santo André com o homicídio de Eloá Cristina Pimentel e lesões graves em Nayara Rodrigues, sendo autor o ex-namorado da primeira, Limderbergue Alves, não causa surpresa aos que analisam e conhecem a psicologia do ciumento, sobretudo em sua forma anormal de paranóia, muito bem exposta desde o século XVII pelo genial Shakespeare – “o mestre das paixões humanas” – em sua famosa obra “Othello (1604), o tipo perfeito do homicida passional .
Antes que tudo, entendemos, em síntese, que do mesmo modo que o paciente de depressão está a um passo de suicídio, é um suicida em potencial, quem é ciumento está a um passo de homicídio ou de lesões corporais (os denominados “crimes de sangue”), é um criminoso em potencial.
2 – Sem dúvida, o ciúme, por si mesmo, por sua própria natureza, é paixão criminógena, perigosa, negativa, destrutiva, sempre gerador de criminalidade o que inúmeros autores e estatísticas evidenciaram em vários países desde o Século XIX. Mesmo na sociedade contemporânea materialista, de consumo dominada pelo “deus dinheiro”, de inversão de valores, de uma sofisticada tecnologia, crimes por ciúme continuarão a ocorrer pois o mistério da alma ou da natureza humana ainda permanece desafiando as teorias ou as soluções dos cientistas e a causar espanto nos cidadãos. Sobretudo, na raça latina que por si mesma é mais passional, mais de temperamento explosivo que racional ou de temperamento controlado como a nórdica, a anglo-saxônica.

3 – Embora sentimento comum, natural em qualquer ser vivo (inclusive nos animais), existindo indistintamente em qualquer membro de classe social ou nível cultural, o ciúme torna-se facilmente obsessivo, delirante, anormal, é uma psicose sob uma verdadeira forma ou espécie de paranóia, ou seja, a mania ou delírio de ciúme, ao lado da mania de grandeza e a de perseguição, como as três clássicas manifestações ou formas de paranóia, conforme a psiquiatria, fazendo com que o ciumento viva em um “inferno” de dúvidas, de suspeitas imaginárias, falsas, sem base na realidade e tornando também um “inferno” a vida da pessoa amada, pois “desconfia” sempre de tudo e de todos.
4 – Particularmente, o ciúme torna-se mais perigoso, mais tendente ao crime quando é dominado pela idéia fixa, obsessiva, falsa de “traição” que de simples dúvida passa a ser na psicologia do ciumento uma “prova de certeza”, de “verdade” que nenhuma evidência ou argumentação contrária irá afastar de sua mente ou imaginação delirante e toda a sua vida mental psíquica será escrava de tal idéia divorciada da realidade, seduzindo o ciumento como um “monstro de olhos verdes (Shakespeare)”.
5 – Por outra parte, como outra característica principal da psicologia do ciumento, sempre “julga” que a “vítima” de sua reação violenta, criminosa “merece” o que sofreu devido à “injustiça” feita contra a sua pessoa por sua “traição” (imaginária, falsa, delirante geralmente).
6 – Ainda (nesta síntese sobre problema tão complexo e profundo científica e humanamente) o drama do ciumento torna-se mais perigoso e próximo do delito porque no homem o seu ciúme intenso tem uma origem predominantemente sexual, “é o orgulho do macho ferido” ou “que se sente humilhado”, que não admite ser abandonado, desprezado ou substituído por outro homem geralmente imaginário, suposto, enquanto na mulher o ciúme a sua raiz é sobretudo afetiva, mais sentimental, porém é mais extenso ao abranger mais pessoas e até coisas.
7 – Por último, o criminoso ciumento considera essencialmente a mulher (a vítima preferencial segundo as estatísticas) como seu “objeto”, “sua propriedade” absoluta e não como “pessoa” em toda a sua dignidade, podendo, assim, usar, abusar, fazer o que quiser com a mesma, sem admitir qualquer contestação, a qualquer título, em tal sentido. Em outro artigo, analisaremos outros aspectos da problemática.

domingo, 15 de março de 2009

NA POLÊMICA DO ABORTO DOS GÊMEOS TODOS TEM(1)RAZÃO


Isaac de Luna Ribeiro: Mestre em Direito; professor de Direito Penal da Faculdade Maurício de Nassau e advogado da Browne Advocacia Consultoria.

O caso do aborto, na gravidez de gêmeos de uma menina de nove anos violentada pelo padrasto no interior de Pernambuco (art. 213 c/c 224, 'a' e 226, II, CP), transformou-se em manchete nacional e, a reboque, pôs lenha no acalorado debate acerca do tema, travado, sobretudo, entre leigos e religiosos no Brasil.

A situação recoloca no centro das discussões antigos dualismos, ao que parece, ainda não superados: Estado x Igreja, direito x moral, fé x razão (ou ciência) e, pela própria natureza das questões que a envolve, bem como as pessoas e instituições nele envolvidas, a solução, seja ela qual for, estará sempre muito próximo do imponderável.

É certo que com o advento da Modernidade, fruto, dentre outras coisas, dos ideais iluministas e racionalistas, à Igreja foi legado um papel restrito a vida eminente privada dos indivíduos, não mais atuando como agente determinante nas questões de ordem pública, prerrogativa essa exclusiva do Estado. Também é verdade que, em grande parte por influência dos escritos de Immanuel Kant (2), ficou posta a separação entre o direito e moral, sendo esta uma conduta de fórum íntimo que depende da concordância de cada um, e aquele uma imposição geral, exterior (bilateral atributiva), e da qual independe, formalmente, a concordância interna dos sujeitos sociais.

Questões recentes, tais como os debates no Congresso Nacional e no STF acerca da manipulação de embriões e células troncos para fins científicos colocaram também em xeque aquela inabalável confiança weberiana (3) de que, no Estado moderno, as decisões seriam tomadas cada vez mais com base em argumentos racionais, afastadas, portanto, as “nuances” da fé, ou, latu sensu, das questões metafísicas.

O midiático embate teológico-científico que se desenvolve em torno do drama da menor pernambucana traz consigo todas as questões sumariamente expostas, insolúveis a séculos e, para usar o jargão de um pensador emblemático desse dualismo, Karl Marx (4), ora travado abertamente, ora nos bastidores da sociedade.

O fato é que, do lugar de onde falam, todos tem razão! Ou, no dizer da professora Marilena Chauí (5), todos os discursos são competentes! Vejamos:

1. Os juristas que se manifestaram acerca do caso tem razão quando afirmam que, independentemente de haver ou não risco de morte para a gestante (art. 128, I - Aborto necessário), não resta dúvida de que a gravidez foi fruto de um estupro presumido (art. 213 em combinação com o art. 224, ‘a’, do Código Penal), hipótese para a qual as leis penais brasileiras prevêem o chamado “aborto terapêutico”, estando o mesmo amparado elo art. 128, II, do Estatuto Penal vigente. Logo, não há qualquer tipo de ilegalidade no procedimento abortivo praticado.

2. A equipe de profissionais da área de saúde que procedeu aos exames e análises do quadro clínico, todos necessários para averiguar o nível do risco da gravidez, também tem razão ao afirmar que as condições atípicas da gestação tinham uma grande probabilidade de, a luz dos conhecimentos científicos da medicina (6), desenvolver situações de elevado risco para a vida da gestante. Aqui, também, não há ilegalidade no ato nem desconformidade com a ética profissional, já que a conduta foi precedida de pareceres de diversos profissionais envolvidos, contou com a aquiescência das mais diversas entidades, sociedades e instituições de representação médica, além de, de mais a mais, ser o dever mesmo profissional do médico salvar a vida em risco eminente

3. Por fim, a Igreja, ao pronunciar-se por diversos dos seus interlocutores oficiais, de forma contrária ao aborto, também tem razão, já que do ponto de vista teológico-cristão a vida deve ser defendida acima de qualquer outra coisa, cabendo unicamente a Deus dela dispor. Os religiosos que se pronunciaram sobre o caso, portanto, subordinados ao mandamento teológico supra e falando em nome da Igreja, foram igualmente coerentes nas suas falas.

Diante do que foi até aqui colocado, tornar-se-ia incoerente concluir alguma coisa; contudo determinadas considerações podem ser acrescentadas ao debate:

a) A primeira é que estamos muito longe de concretizar o postulado moderno da separação entre razão e moral – se é que essa empreitada é mesmo possível;

b) Em segundo lugar que a Igreja, nesse caso específico a católica, nada mais fez do que reafirmar a sua tese (ou dogma) de defesa incondicional da vida, e não respeitá-la no seu posicionamento equivaleria a violação do direito constitucional de liberdade de expressão da fé religiosa (Art. 5º, VI, CF);

c) A terceira é conseqüência direta da anterior, ou seja, por esse prisma a lista de excomunhão da Igreja deverá ser consideravelmente ampliada (assassinos, instigadores do suicídio, defensores da eutanásia, dentre outros)

d) Ademais, que os profissionais médicos envolvidos agiram dentro dos limites éticos e legais da sua profissão e as únicas considerações a que podem ser submetidos são de caráter moral, unicamente por parte das religiões as quais estão vinculados;

e) Também que a exploração midiática do caso expõe, de forma sensacionalista, a vítima, a família, os profissionais envolvidos e os religiosos, mas ao mesmo tempo possibilita o debate social sobre o tema: afinal, como certa feita já questionou o filósofo, de que lado você está – dos mandamentos da fé ou dos postulados da razão?

Enfim, muito pode ser ainda dito sobre esse caso, e uma boa diretriz para o debate pode está, também, dentre muitos outros, em um livro que retrata uma troca de cartas entre o cardeal do vaticano Carlo Maria Martini e o escritor e filósofo Umberto Eco, intitulado Em que crêem os que não Crêem, onde se discute os fundamentos teológicos e racionais da ética humana (7).

Por enquanto, o máximo que pode ser dito sem se incorrer em intolerâncias ou autoritarismos é que, cada um dos envolvidos na polêmica, das posições onde se encontram, está certo, ou, dito de outra forma, é coerente com o papel social que desenvolve e com os postulados éticos do subsistema a que está vinculado (8).

Afinal, como deve ser entendido o aborto: crime ou direito, pecado ou misericórdia?

NOTAS:

(1) Em conformidade com a reforma ortográfica da língua portuguesa

(2) KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes e outros escritos. Martins Claret. São Paulo, 2003.

(3) WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos de sociologia compreensiva. Brasília, UNB. 1999

(4) MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto Comunista (Comentado por Chico Alencar). Rio de Janeiro: Gramond, 1998.

(5) CHAUÍ, Marilena. Cultura e Democracia: o discurso competente e outras falas. São Paulo: Cortez, 2003

(6) Nesse particular, o conceito de conhecimento científico a que se refere o texto é aquele sugerido por Karl Popper, ou seja: probabilístico, demonstrável e falível, para citar apenas os aspectos mais relevantes no caso em exame.

(7) ECO Umberto; MARTINI, Carlo Maria. Em Que Crêem Os Que Não Crêem?. Rio de Janeiro: Record, 2001. 160 páginas.

(8) Para aprofundamento nesse assunto ver: LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito 1. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983.

sábado, 14 de março de 2009

O BBB

MIGUEL REALE JÚNIOR: advogado, professor titular da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras.


Programas como Big Brother indicam a completa perda do pudor, ausência de noção do que cabe permanecer entre quatro paredes. Desfazer-se a diferença entre o que deve ser exibido e o que deve ser ocultado. Assim, expõe-se ao grande público a realidade íntima das pessoas por meios virtuais, com absoluto desvelamento das zonas de exclusividade. A privacidade passa a ser vivida no espaço público.
O Big Brother Brasil, a Baixaria Brega do Brasil, faz de todos os telespectadores voyeurs de cenas protagonizadas na realidade de uma casa ocupada por pessoas que expõem publicamente suas zonas de vida mais íntima, em busca de dinheiro e sucesso. Tentei acompanhar o programa. Suportei apenas dez minutos: o suficiente para notar que estes violadores da própria privacidade falam em péssimo português obviedades com pretenso ar pascaliano, com jeito ansioso de serem engraçadamente profundos. Mas o público concede elevadas audiências de 35 pontos e aciona, mediante pagamento da ligação, 18 milhões de telefonemas para participar do chamado "paredão", quando um dos protagonistas há de ser eliminado. Por sites da internet se pode saber do dia-a-dia desse reino do despudor e do mau gosto. As moças ensinam a dança do bumbum para cima. As festas abrem espaço para a sacanagem geral. Uma das moças no baile funk bebe sem parar. Embriagada, levanta a blusa, a mostrar os seios. Depois, no banheiro, se põe a fazer depilação. Uma das participantes acorda com sangue nos lençóis, a revelar ter tido menstruação durante a noite. Outra convivente resiste a uma conquista, mas depois de assediada cede ao cerco com cinematográfico beijo no insistente conquistador que em seguida ridiculamente chora por ter traído a namorada à vista de todo o Brasil. A moça assediada, no entanto, diz que o beijo superou as expectativas. É possível conjunto mais significativo de vulgaridade chocante? Instala-se o império do mau gosto. O programa gera a perda do respeito de si mesmo por parte dos protagonistas, prometendo-lhes sucesso ao custo da violação consentida da intimidade. Mas o pior: estimula o telespectador a se divertir com a baixeza e a intimidade alheia.
O Big Brother explora os maus instintos ao promover o exemplo de bebedeiras, de erotismo tosco e ilimitado, de burrice continuada, num festival de elevada deselegância. O gosto do mal e mau gosto são igualmente sinais dos tempos, caracterizados pela decomposição dos valores da pessoa humana, portadora de dignidade só realizável de fixados limites intransponíveis de respeito a si própria e ao próximo, de preservação da privacidade e de vivência da solidariedade na comunhão social. O grande desafio de hoje é de ordem ética: construir uma vida em que o outro não valha apenas por satisfazer necessidades sensíveis. [...]

FONTE: O Estado de São Paulo, 02 de fevereiro de 2009

sexta-feira, 13 de março de 2009

SOBRE O ASSASSINO EM SÉRIE

Caros Pesquisadores,

Vejam o texto inédito do professor Roque de Brito Alves.

Comentem.


ROQUE DE BRITO ALVES
Professor e Advogado
Email:jodigitação@hotmail.com

1 – Os casos ocorridos na semana passada na Alemanha (país de baixa criminalidade violenta) e nos Estados Unidos (de alta violência) dos denominados “Assassinos em Série” (“serial killer”, “tueur en série”) apresentaram, mais uma vez, as características principais de tais tipos de criminosos.
2 – Entendemos como “assassino em série” (homicida múltiplo) aquele que mata sucessivamente, em curto período de tempo, em espaços (lugares) próximos, várias pessoas e cuja conduta criminosa indica uma certa uniformidade na ação, no meio utilizado, no modo de execução e no fim visado, com motivação geralmente desconhecida e, por último, comete geralmente suicídio após a sua “fúria assassina” (o que ocorreu na semana passada).
3 – Entre os inúmeros exemplos na história criminal, citamos como os mais famosos o de Jack, o Estripador (“Jack, the Ripper”) em Londres, nas últimas décadas do séc. 19, Landru, o Barba Azul, na França, 1910-1920, Peter Krueten (o “O Vampiro de Dusseldorf”), na Alemanha, na década de 1920, e entre os mais recentes o do “Canibal (Jeffrey Dahmer), nos Estados Unidos, etc., sendo tal tipo de criminoso objeto já de grande bibliografia e de inúmeros filmes (“O silêncio dos Inocentes”, “Assassino por Natureza” “Inferno”, etc.).
4 – Ultimamente, como um tipo específico de assassino em série, o que mata somente mulheres (as vítimas de Jack o Estripador, foram prostitutas, no séc. 19), como no caso do casal West, na Inglaterra (mulheres que eram enterradas na própria residência), de Gary Ridgway, nos Estados Unidos que confessou, em 2003, ter morto quarenta e oito (48) meretrizes desde 1982, etc.
5 – Não se conhecendo ainda a causa pela qual a grande maioria (80%) de tais crimes ocorre nos Estados Unidos, existem, em nossa opinião, amplamente três (3) tipos básicos de assassinos em série: a – O normal; b – O doente mental, anormal e c – O fronteiriço, e perante tais criminosos existe sempre a pergunta: louco ou cruel?
Entre os mentalmente normais, podem ser incluídos os assassinos de aluguel, os pistoleiros, como se fosse uma “profissão” e ainda os denominados “justiceiros” – muito comum hoje no Brasil – que matam “certos” de que as vítimas “merecem morrer”, pois somente matariam “marginais”, “bandidos”, “fazem justiça”, pois “livram a sociedade de maus elementos”... O terceiro tipo (o fronteiriço, o psicopata) é que constitui o “serial killer” propriamente dito, em nossa compreensão, bem evidente nos casos agora ocorridos, não é irresponsável penalmente, sabe muito bem o que faz, merece a aplicação da pena. Porém, muitas vezes, foi descrito como um tipo tranqüilo, calado, solitário, sem convivência social – podem ser sintomas ou características de esquizofrenia – e de quem nunca se espera a grande violência homicida.
Em geral tal assassino atua sozinho (não existe grupo de assassinos em série), é jovem (18 – 30 anos), fascinado por armas, de bom nível intelectual (estudante ou formado em universidade em muitos casos), boa situação econômica (muitos de classe média alta) branco (famoso como homem de cor apenas o caso do “Atirador de Washington”), não é “favelado” ou de “bairro pobre” (“slums”), etc. A ação criminosa é de grande impulsividade ou violência, muitas vezes com idéias delirantes, praticada em locais públicos – escolas, locais de trabalho, restaurantes, praças, etc. – à vista de todos (alguns avisaram pela Internet), sem dissimulação e o suicídio segue-se à fúria homicida, sendo ínfimos os casos em que se entregou à polícia.
Afinal, nesta análise, em síntese, é do sexo masculino (somente o caso famoso de uma assassina em série que foi Aileen Wuorms) e muitos reagiram como vingança por maus tratos, humilhações, desprezos, etc. que sofreram em família ou no ambiente de trabalho ou escolar.

terça-feira, 10 de março de 2009

O CRIMINOSO PASSIONAL EXISTE

Roque de Brito Alves
Advogado e Professor
roque.brito@rec.mauriciodenassau.edu.br


1 – Antes de mais nada, o denominado criminoso passional não se confunde somente com o crime por amor pois abrange qualquer sentimento ou paixão humana mais amplamente (ódio, ciúme, inveja, etc.) e realmente existe, não se pode negar a sua existência pois seria negar a própria realidade, a psicologia, o temperamento e a mentalidade da raça latina, e uma imensa bibliografia científica, jurídica e literária a respeito, sobretudo desde o século XIX e sem esquecermos o seu personagem maior que é o “Othello” da tragédia de Shakespeare, encenada pela primeira vez em 1604. Particularmente, como advogado criminal defendemos inúmeros delinquentes passionais, em dolorosos dramas humanos que foram além de qualquer imaginação ou ficção, com as suas características principais comprovadas (arrependimento posterior, idéias fixas ou obsessivas, suicídio ou tentativa de suicídio, grande impulsividade ou emocionalismo na conduta delituosa – o que se manifesta ou explica as inúmeras lesões que geralmente a vítima apresenta –, não reincidência, etc.).
2 – Em verdade, na problemática, evitando-se confusões, tal negativa, sob qualquer aspecto, e por várias razões é inaceitável pois o que é essencial é não justificar-se ou absolver-se tal espécie de criminoso, o que atualmente é inadmissível perante a doutrina penal nacional e estrangeira e em face dos textos claros ou imperativos próprias legislações penais contemporâneas, exemplificando-se, aqui, com o inc. I do art. 28 do nosso vigente Código Penal (a emoção e a paixão não excluem a imputabilidade penal), o art. 90 do atual diploma penal da Itália no sentido de que “os estados emotivos ou passionais não excluem e nem diminuem a imputabilidade”, etc., a culpabilidade de agente existe, uma punição é necessária.
Na matéria, o que as legislações penais contemporâneas admitem, perante certas circunstâncias, é a atenuação comum ou especial da pena do denominado criminoso emocional – delito por emoção – , de um “homicídio privilegiado” por motivo de relevante valor moral ou social, por provocação injusta da vítima pela violenta emoção que domina o agente, etc., como no § 1º do art. 121 do vigente estatuto penal brasileiro, nos números 1 e 2 do art. 62 do italiano, etc. etc.
Por outra parte, neste aspecto jurídico-penal do tema, se tal absolvição não seria legítima ou legal, é também juridicamente improcedente sustentar-se – o que ultimamente tem ocorrido em nosso país – como acusação que o delinqüente passional age por “motivo torpe” ou por “motivo fútil”, como qualificadoras do homicídio para o grande aumento de pena – como “homicídio qualificado”, atualmente classificado como “crime hediondo” – , o que, em nosso entendimento, é uma verdadeira aberração jurídica, científica e humana injustificável ou inaceitável a qualquer título ou sob qualquer aspecto tendo-se em visto a personalidade de tal criminoso e os próprios conceitos jurídicos a respeito da motivação humana.
3 – Tema sempre polêmico por sua própria natureza – à exemplo da problemática do aborto, da eutanásia, etc. –, teses extremadas existem através de frases bem expressivas favoráveis ou contrárias como “quem ama, não mata” e “quem ama, não trai”, porém as estatísticas demonstram que em nosso país crimes por estado de violenta emoção ou por paixão (amor, ciúme principalmente este, ódio, inveja, perante um flagrante adultério , etc.), são cometidos diariamente, sem distinção alguma cultural, social ou econômica em relação ao seu agente, qualquer um pode ser o seu autor como a nossa realidade tem evidenciado.
4 – Em nosso livro “Ciúme e Crime. Crime e Loucura” (com prefácio do professor e Ministro da Suprema Corte de Justiça da Argentina, Eugenio Raul Zaffaroni, um dos maiores penalistas do mundo, e com o “resumo” em francês e em inglês), analisamos amplamente a problemática e também em cursos, conferências e artigos na imprensa e em revistas especializadas.

terça-feira, 3 de março de 2009

ENTREVISTA: EUGÊNIO RAUL ZAFFARONI


Olá Caros Pesquisadores,



Venho por meio deste agraciá-los com uma entrevista fornecida pelo professor Fernando Alves, membro do grupo de pesquisa, com o mestre Raúl Zaffaroni.

Fonte:

El País, 17.2.09
ENTREVISTA "Estados Unidos debe cambiar su política de derechos humanos, más allá de Guantánamo"
Raúl Zaffaroni, juez de la Corte Suprema argentina, critica la política antiterrorista tras el 11-S
ANTÍA CASTEDO - Madrid - 17/02/2009
Violaciones de los derechos humanos, incluyendo la tortura, desapariciones forzosas, detenciones secretas y arbitrarias, juicios sin garantías. Un panel internacional de ocho juristas ha llevado a cabo una investigación durante tres años para documentar la lucha antiterrorista liderada por Estados Unidos tras los ataques del 11-S y han elaborado un informe. Personalidades como Mary Robinson, ex presidenta de Irlanda y ex Alta Comisionada de la ONU para los derechos humanos, o Arthur Chaskalson, primer presidente del Tribunal Constitucional de Sudáfrica, denunciaron ayer en Ginebra que el orden legal internacional está en peligro.
Critican que los estados hayan otorgado cada vez más poder a sus agencias de inteligencia en la lucha contra el terrorismo para evitar el control de los poderes judicial y legislativo. Y llaman a la Administración de Obama a revertir las prácticas de la "guerra contra el terror" de la era Bush. El juez Raúl Zaffaroni (Buenos Aires, 1940), miembro de la Corte Suprema argentina y uno de los ocho panelistas, ha hablado por teléfono con ELPAÍS.com sobre los peligros de luchar contra el terrorismo fuera de la ley.
Pregunta: Ustedes afirman de forma muy contundente en su informe que la respuesta de algunos gobiernos a los ataques del 11-S ha puesto en peligro el orden legal internacional, basado en el respeto por los derechos humanos. ¿Por qué?
Respuesta: En el aspecto formal, toda legislación antiterrorista dispone la incorporación de pruebas sin derecho a la defensa, la privación de libertad sin control judicial, etc. Se trata de un conjunto de medidas que se introducen en una legislación con motivo de un delito particular, son medidas de urgencia que están vigentes por un tiempo determinado. Lo que sucede, en la práctica, es que esta legislación de emergencia se extiende y acaba contaminando todo el sistema legal. Eso es, en líneas generales, lo que hemos visto en nuestra investigación.
P: ¿Cree que la opinión pública se ha movilizado lo suficiente para defender sus derechos y libertades, o el miedo ha servido para justificar prácticas poco justificables?
R: Es verdad que tras el 11-S hubo pánico y esto puede hacer que la opinión pública se incline a aprobar estos procedimientos. Pero lo que queremos resaltar es que esto produce graves problemas en el sistema penal y que, además, tiene efectos contraproducentes para la propia lucha antiterrorista. Se ha producido la estigmatización de algunas comunidades, por ejemplo las comunidades islámicas, y esto favorece la identificación de algunos jóvenes con los extremismos.
P: También critican que en algunos países se ha aplicado la legislación antiterrorista a supuestos que no tenían nada que ver, a viejos conflictos internos.
R: Sí, esas leyes se han instrumentalizado con motivos que tienen poco o nada que ver con el terrorismo.
P: Dicen que las agencias de inteligencia tienen cada vez más poder y más recursos, y que la cultura del secretismo ha servido para evitar que se asumieran responsabilidades.
R: Ha habido una tendencia a la autonomización de las agencias de inteligencia con respecto a los poderes políticos, y estas agencias cada vez son más poderosas. Han adquirido nuevos poderes de vigilancia, arresto, detención e interrogación, suplantando a las autoridades correspondientes, y sin que nadie ejerza ningún tipo de control democrático sobre ellas. Es algo muy peligroso.
P: Ustedes piden al presidente de Estados Unidos, Barack Obama, que lleve a cabo una investigación amplia y transparente sobre las prácticas de la "guerra contra el terror", y que asuma un rol de liderazgo en la promoción y la defensa de los derechos humanos.
R: Confío en que Estados Unidos modifique su política, más allá del cierre de Guantánamo, dado, entre otras cosas, el desprestigio que le ha causado en buena parte del mundo. Creemos que hay países que ejercen su liderazgo y que deben mantener una conducta ejemplar en materia de derechos humanos. Si no, ¿qué vamos a hacer los países de la periferia? No deja de asombrarme y apenarme que, a estas alturas, Estados Unidos diga que va a acabar con la tortura.
P: El informe defiende que no hay que renovar el orden legal internacional que existía antes del 11-S, que es suficiente.
R: Es suficiente en la medida en que los gobiernos lo respeten
P: Pero, ¿no creen que hoy existan nuevas amenazas y que quizás tengan razón los que defienden que hay que adaptar las leyes?
R: Hay nuevas amenazas ligadas al terrorismo, pero ni el terrorismo ni la delincuencia común son los principales retos a los que nos enfrentamos. Se puede y se debe reforzar la ley, pero para hacer frente a peligros mucho más graves, como el deterioro ambiental del planeta.

fonte:http://www.revan.com.br/zaffaroni.htm